Nocturno de Londres

Fotografia de Herbert List


Não sei, amor, se dado nos será
de envelhecer. Será que um de nós só morrerá
quando formos tão velhos que para o outro
não faz diferença nenhuma que aquele morra
(na velhice se vive de memória vaga)?
Será que tantos anos de amargura,
suspeitas, frustações, raivas e ódios,
tudo isso, tempestade, de que é feito o amor
que os burros não entendem, nos serão
acrescentados desse sonhar juntos
em silêncio, num sorriso (que se esquece
e mesmo nos lábios se ignora).
Uma velhice que foi vida e será vida
porque foi vida com que nos comemos
quotidianamente um ao outro
vorazes como peixes num aquário
de vidro inamovível, tão opaco,
translúcido às vezes, transparente sempre,
que é o amor?
Jorge de Sena

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